terça-feira, 4 de outubro de 2011

Desapego


   Um dia eu decidi me afastar de tudo aquilo que me fazia mal. E fui além, me afastei de toda coisa ou pessoa que me fizesse qualquer outra coisa que não fosse bem. Me desfiz de bijuterias datadas, joguei fora isqueiros velhos, me livrei de livros sem sentido, amassei montes de papéis e joguei sem olhar para trás até algumas alianças, no lixo, que era afinal o lugar delas. Me desfiz de qualquer objeto ou pessoa que não fosse absolutamente necessário e benigno, ainda que me doesse, e acredite quando eu digo, caro leitor, que uma das coisas mais difíceis para um ser humano fazer é o desapego. 
   E não falo apenas de jogar uma dúzia de coisas fora. Não falo de ter a coragem de dizer eu não quero mais isso na minha vida. Falo da resignação - essa palavra horrível - de dizer para si mesmo  Eu quero isso na minha vida, como quis poucas coisas. Quero isso e a todas as ilusões cabíveis que isso me proporciona, mas estou aqui, diante do universo, com o coração na manga, abrindo mão disso que eu quero tanto, mas que me intoxica demais. Quero, mas não preciso. Preciso não precisar
   E se fiz isso, foi tão somente porque decidi que não me restava mais tempo algum nessa vida curta de Deus para gastar com qualquer coisa que se assemelhasse a sofrimento, a dor de cotovelo. Que a sociedade me perdoe, mas não nasci para este papel de mártir sofredora novelística ao qual por tanto me adequei tão bem.
   Um dia eu decidi me afastar de tudo aquilo que me fazia mal. E descobri que a única coisa que me fazia mal era eu mesma.

Um comentário:

Fernanda Gadelha disse...

<3 Eu me senti lendo uma obra de Clarice, mas quero te dizer que isso tudo tem uma marca peculiar. Porque tu tem um jeito só teu de fazer isso, um jeito que pode ser tão bom quanto o dela ou ainda melhor. Tua marca, que eu to começando a encontrar lendo os teus outros textos, é uma coisa linda de se ler. Continua assim, vai, talento tu tem de sobra, garota.